quinta-feira, 16 de maio de 2013

A MELHOR SURPRESA DO SUL DA INGLATERRA

Famosa pelos seus “white cliffs”, as falésias brancas que decoram a sua costa, Dover é uma cidadezinha típica inglesa. Localizada em Kent, sudeste da Inglaterra, é o ponto mais próximo, geograficamente, do continente europeu, e de onde, diariamente, centenas de barcos, catamarãs, ferries e



hidrofólios deixam o seu porto e fazem a travessia para as cidades de Calais, Dunkerk e Bologne, na França, e Oostand, na Bélgica. Trata-se de um dos portos mais movimentados do mundo, em termos de passageiros, mesmo com o Eurotúnel. Seu funcionamento é de 24 horas por dia e calcula-se que mais de 13 milhões de pessoas passam por lá, todos os anos, para atravessar o Canal da Mancha. Fosse esse um pessoal mais esperto, não apenas passaria por Dover, mas permaneceria na cidade, pelo menos, 2 dias, para explorá-la como merece.


o centro da cidade
Eu fiz como a maioria: havia passado umas duas vezes por Dover e, confesso, nunca dei bola pra cidadezinha, até que fui fazer intercâmbio em Ramsgate, que fica por perto. Conversando com o pessoal da escola, fiquei sabendo que Dover era muito mais que um porto e merecia uma visita mais demorada. Num fim de semana, combinei com meus amigos Hélio e Dulce, dois brasileiros de Recife, e fomos ver Dover de perto.

Dulce e eu no Dover Castle
São 34 mil habitantes e uma economia que gira, praticamente, em torno do porto. Suas falésias são formadas de conchas e criaturas marinhas que viviam na superfície da água e foram sedimentadas há mais de 80 milhões de anos. Elas – as falésias - ficaram famosas durante a Segunda Guerra Mundial, quando a cantora Vera Lynn evidenciou-as com a sua música “Blue Birds over the White Cliffs of Dover”, que dizia que eram a primeira coisa a ser vista por amigos e inimigos quando se aproximavam da costa inglesa. William Shakespeare também usou o cenário das falésias nas suas peças. Charles Dickens foi outro que se inspirou na cidade para a ambientação dos seus livros. Pródiga em histórias pitorescas, com personagens famosos, foi lá que Louis Bleriot aterrissou com seu avião, depois de voar pelo canal da Mancha, vindo da França. Como foi o primeiro homem a realizar tal façanha, um memorial, atrás do Castelo de Dover, lembra o feito.


memorial
A cidade é pequena, cheia de recantos, parques particulares, praças, bosques, casas encantadoras, que parecem saídas dos contos de fadas. Kent é uma região conhecida como o “Jardim da Inglaterra” e seus moradores, para fazerem valer a fama que se espalhou pelo mundo, cuidam, com capricho, dos seus jardins e quintais.




Dover também tem igrejas de quase mil anos, construções centenárias, ruelas bucólicas e monumentos que contam a história daquele pedacinho do país. Obviamente, os romanos passaram por ali, assim como os vikings, e está tudo registrado. Mas, um dos pontos turísticos mais interessantes da cidade é uma cadeia, aberta à visitação, no centro da cidade. Tudo por dentro permanece do jeito como era há séculos, inclusive as celas, com bonecos que substituem os antigos prisioneiros. Quem não estiver atento pode pensar que são pessoas de verdade, atores que estão ali, interpretando um papel. Mas, não. São bonecos lisos, brancos, que recebem a projeção de uma imagem de alguém que, aí, sim, está interpretando o prisioneiro daquela cela. Para completar a cena, o som ambiente é perfeito e a voz do tal boneco é tão real e sincronizada com o movimento da boca projetada, que a dúvida faz parte do espetáculo. O resultado é tão surpreendente que a visita se torna uma experiência inesquecível, emocionante.

O Dover Castle
Mas o que Dover tem de mais especial é o seu castelo. Pairando, majestoso, acima das falésias que cercam o litoral sul da Inglaterra, vigiando o seu porto e observando, com vantagem, quem se aproxima, o Dover Castle é a primeira construção vista de longe por quem chega à Inglaterra pelo mar.




As primeiras partes do castelo datam de 1066, mas grande parte do que se pode ver, hoje, é do século XII, época de Henry II. Uma enorme e grossa muralha cerca o castelo e 14 torres estão distribuídas ao longo da muralha. Sua beleza inspirou diversos castelos construídos depois dele, inclusive o castelo de Windsor.

Por estar numa posição estratégica, o Dover Castle, o maior castelo da Grã-Bretanha, foi e é mais um quartel do que uma residência real, mais histórico do que romântico. Mais importante do que famoso. Tanto é que pouca gente sabe que Dover é muito mais do que uma via de passagem. Sua história começa muito antes, como comprova o farol construído pelos romanos no século I d.C. Depois, os anglo-saxões contribuíram com a cidade fortificada, onde fica a igrejinha St. Mary-in-Castro. Depois, Henry II construiu o mais monumental edifício do castelo: a torre central, por onde toda visita deve ser iniciada. Mas existem outras construções que devem ser visitadas, o que pode levar um dia inteiro do turista: torres, capelas, museus, salas, canhões, tudo da forma mais aproximada do que foi, um dia.




O Dover Castle teve um papel importante na Segunda Guerra Mundial. Por trás das suas muralhas, ficava o posto avançado da inteligência aliada, onde Churchill manteve um escritório numa construção vitoriana, conhecida como The Officer´s Mess, com vista para o porto e a cidade. Esses escritórios foram projetados por Antony Salvin, o mesmo que restaurou a Torre de Londres.

The officer´s Mess - onde ficava o esritório de Churchill
Hoje, ao visitar o castelo, podemos ter acesso aos 4 andares do hospital que ficava no subsolo. Antes de entrar, os visitantes assistem obrigatoriamente a um filme explicativo que, no final, pede aos mais emotivos e cardíacos que desistam da visita, por se tratar de uma experiência, realmente, forte. Durante o trajeto, passa-se pelas salas de cirurgias, pronto-socorro e demais dependências, com todo o clima da época da guerra: por cima das macas, sangue, curativos, bisturis e outros instrumentos. O áudio reproduz as bombas caindo, aviões executando vôos rasantes, os feridos, médicos e enfermeiras gritando. No ar, o cheiro de queimado. Tudo muito real e emocionante. 
o impressionante hospital



No museu, estão disponíveis para o público, a estação de telecomunicação e como ela funcionava na época da guerra, com todos os ruídos característicos; a sala de operações aéreas, com mapas e estratégias desenhadas em grande escala; túneis secretos, escritórios e salas de reuniões. Ao contrário do que se pensa, as crianças se divertem no castelo. Numa área interativa dedicada à espionagem, toda computadorizada, elas podem descobrir os segredos de James Bond ou saber como a espionagem funcionava durante a guerra, os códigos, os agentes e os instrumentos e disfarces que usavam. Para dar conta de todo o programa, um restaurante funciona durante todo o dia – uma pausa necessária para processar tudo o que se viu.

        sala de comando
sala de comunicação

Dover, ignorada pela maioria das pessoas que passa por ali, a caminho da França ou Bélgica, supera as expectativas que quem visita a cidade pela primeira vez. Quem gosta de História, deleita-se com a quantidade e qualidade das informações, programando a cidade no roteiro da próxima viagem.