terça-feira, 29 de julho de 2014

Nunca te vi, sempre te amei

Paris é assim: a gente ama antes de por os pés em solo francês. Isso porque ouvimos falar do país desde a escola, quando estudamos a Revolução francesa, Queda da Bastilha etc. Figuras como Luís XIV, Napoleão e Madame Pompadour nos são tão ou mais familiares quanto o nosso Duque de Caxias, por exemplo. Muitas vezes, os franceses são lembrados antes de brasileiros. Por exemplo: um filósofo dos tempos modernos? Sartre. E um filósofo brasileiro? Vamos precisar pensar um pouco mais ou corremos, logo, para o Google. E por aí vai.


Napoleão - um velho conhecido nosso

A França é o berço da civilidade, do Impressionismo, da moda, da culinária, dos vinhos, da perfumaria, dos cosméticos, do luxo e dos supérfluos! Paris, sua capital, é o destino preferido de quem está apaixonado, de quem terminou um relacionamento, de quem quer estudar ou, simplesmente, ser feliz. Em qualquer época do ano, idade ou situação, Paris é o melhor destino que se pode desejar ou oferecer.
Uma viagem à capital francesa pode ser transformadora, para muitos. E o mínimo de permanência, definitivamente, não existe. Por mais tempo disponível na cidade, o ideal é se programar para voltar outras vezes porque, claro, alguma coisa sempre vai ficar de fora.


Champs Elysées - uma das doze avenidas que convergem para a Praça Charles de Gaulle

as coloridas e deliciosas guloseimas parisienses

Tour Eiffel - o centro das atenções

tulipas de todas as cores no mercado de flores

A primeira vez que fui a Paris, logo percebi que, querer ver todo o Museu do Louvre em uma só visita, por exemplo, é impossível. São mais de 220 salas distribuídas em 3 andares, com mais de 5 mil peças. Como não tinha escolha, selecionei as minhas preferências: antiguidades egípcias, Renascimento e, claro, as obras mais famosas: Monalisa, Vitória de Samotrácia, Vênus de Milo, Escriba Sentado, Código de Hammurabi, além de Rafael e Goya.


O Louvre e as centenas de visitantes todos os dias

Vitoria de Samotrácia e seu drapeado famoso

Monalisa

Escriba Sentado - meu preferido

Outro museu que vale a pena visitar é o d’Orsay. O prédio foi projetado para a exposição da virada de século, em 1900, mas virou estação de trem e, depois de ter passado 47 anos fechado e ter escapado de ser demolido na década de 70, reabriu em 1986, como museu – diga-se de passagem, um dos mais bonitos da cidade. Seu acervo é dos mais significativos. Lá, estão em exposição permanente: a Bailarina, de Degas; As Portas do Inferno, de Rodin e o Almoço na Relva, de Manet, entre tantas maravilhas. Estas são algumas das obras que contribuem para fazer deste museu um dos mais importantes do mundo.


a antiga estação de trem que virou museu. 

Dúvida cruel: o que é mais bonito, a estrutura ou o conteúdo do museu?

A Bailarina

a Porta do Inferno - quem não quer vê-la de perto?

Le Moulin de la Gallete, de Renoir

Sempre gostei de caminhar pelas ruas das cidades que visito. E em Paris, esse pode ser o melhor programa. Basta disposição. A cada esquina, rua, prédio ou monumento, história, história e mais história contada da forma mais simples e lúdica, o que confirma a tese de que viajar é a melhor escola. As inúmeras pontes, todas com nome, história e personalidade própria, tornam possível ir de um lado para outro sem problemas. A Pont des Arts é famosa pelos cadeados deixados nas grades, pelos casais apaixonados. A prefeitura até já andou limpando a ponte, mas novos cadeados surgiram. Sinal de que o amor sempre vence! 

Na rive gauche fica o Quartier Latin, o pitoresco bairro dos artistas, intelectuais e estudantes da Sorbonne, sede da Universidade de Paris. Aliás, deram este nome ao bairro justamente porque o Latim era a língua falada por eles. A Place Saint Michel é o coração do bairro, palco dos acontecimentos mais importantes, como as revoltas estudantis de maio de 1968. Ainda no Quartier Latin, o Musée de Cluny, cujo nome oficial é Museu Nacional da Idade Média. Ele guarda uma importante coleção de arte medieval; o Boulevard Saint-Michel, com seus cafés, livrarias, restaurantes, lojas e cinemas reúne moradores, frequentadores do bairro e turistas; a Rua Galande era o endereço dos ricos do século XVII, mas hoje é conhecida pelas suas animadas tavernas; o Panthéon, outra referência do bairro, é fruto de uma promessa a Sainte Geneviève, feita por Luís XV. Sua construção levou 26 anos e lá estão os restos mortais de Jean-Jacques Rousseau, Victor Hugo e Emile Zola.   
O Jardin du Luxembourg é o máximo da arquitetura francesa. Entre as atrações naturais estão as laranjeiras, nogueiras e palmeiras, os gramados, o orquidário e o pomar. Mas, encontramos, também, estátuas de rainhas da França, escritores, artistas, fontes, quadras e tênis e espaço para crianças brincarem. No verão, os turistas se juntam aos parisienses para tomarem sol, lerem ou ouvirem a música de bandas que tocam no coreto próximo à entrada do Boulevard Saint Michel.

Saint-Germain-des-Prés, que também fica na margem esquerda do Sena, é outra área interessante, com seus prédios do século XVI, e sua fama de lugar frequentado pelos filósofos existencialistas, atores, músicos e escritores, entre eles Sartre, Simone de Beauvoir, Juliette Grecco, Hemingway e cineastas da Nouvelle Vague. Ainda hoje, turistas e jovens escritores se dirigem para o Les Deux Magots ou Café de Flore na esperança de sentar nos mesmos lugares que seus ídolos ou, simplesmente, ver gente famosa.

Uma cidade para ser contemplada

Para ver a Torre Eiffel, rume para Hôtel des Invalides, que tem esse nome por causa de um hospital que Luís XIV mandou construir para abrigar os veteranos feridos e desabrigados. O prédio, de tão imponente, acabou dando nome à área, onde tudo é de uma proporção monumental. Trata-se de um dos locais mais privilegiados de Paris, com as aristocráticas casas das ruas Varenne e Grenelle, os edifícios luxuosos das avenidas que circundam a torre e várias embaixadas. O dourado teto da Igreja Dôme é visto de longe. Ali, estão os restos mortais de Napoleão, num sarcófago vermelho, bem no centro da cripta circular. Podemos dizer que o desejo de ter as suas cinzas repousando às margens do Sena foi quase atendido, uma vez que a Dôme fica a alguns quarteirões do rio.




Do lado direito do Hôtel, fica o Musée Rodin, do maior escultor francês do século XIX. Por muitos anos, Auguste Rodin morou numa mansão do governo e, em troca, deixou toda a sua obra para o país. No museu, estão algumas das mais conhecidas obras do escultor: O Beijo, O Pensador, Burgueses de Calais, Balzac e Portas do Inferno.

Em meio a tantas preciosidades, a Torre Eiffel ainda é a grande vedete – da área, da cidade e do país. E está entre os monumentos mais conhecidos e visitados do mundo. Construída para a Exposição Universal de 1889, a torre chegou a ser criticada, muitos desviavam o caminho para não ter que olhar “aquele monte de ferro fundido”, mas ela acabou por conquistar moradores e turistas. Os 320 metros de altura podem ser vencidos por um elevador que ainda utiliza o mecanismo original. Nos dias mais quentes, em função da expansão dos metais, a torre cresce 15 cm. No primeiro andar, um pequeno museu conta a história da torre através de um filme onde, em algumas cenas, aparecem Charlie Chaplin, Adolf Hitler e Josephine Baker como ilustres visitantes do monumento. No segundo andar, o restaurante Jules Verne serve a divina culinária francesa. E, do terceiro, a vista é das melhores, podendo, nos dias claros, alcançar até 72 km de distância.

Champs Elysées - uma avenida cheia de história e atrações


A avenida mais famosa de Paris é a Champs-Elysées - o metro quadrado mais caro da cidade. Nela, foram comemorados grandes acontecimentos: as vitórias nas duas guerras mundiais, o bicentenário da Revolução, e é o palco preferido para comemorar os réveillons, Copa do Mundo, além dos desfiles cívicos e militares. Com uma largura incrível, as calçadas são amplas, ideais para acolher os milhares de turistas que lotam a avenida em busca de bares, restaurantes, lojas e cinemas. Tomar um café numa daquelas mesinhas da calçada ou sair caminhando sem destino é uma das melhores opções se o objetivo e ver e ser visto. Cercando a avenida, palácios, jardins, mansões e teatros. A Champs-Elysées é uma das 12 avenidas que começam na Place Charles de Gaulle, onde fica o Arco do Triunfo, a promessa de Napoleão aos seus soldados pela vitória na Batalha de Austerlitz.
Nesta importante avenida, no número 104, morou o brasileiro Alberto Santos Dumont. Nesse endereço, podemos ler que ali o inventor, construtor e piloto brasileiro, pioneiro da Aeronáutica, aterrissou o seu dirigível no. 9.

O Arco do Triunfo talvez seja o monumento mais bonito de Paris. Embora a praça onde esteja localizado se chame Charles de Gaulle, os franceses a chamam de Etoile – por causa das 12 avenidas que formam uma estrela. Do alto do arco, dá para ver essa formação, assim como o trânsito em torno – caótico. Por isso, o acesso só é possível por um subterrâneo. Lá de cima também é possível apreciar a vista da Torre Eiffel, Montmartre a e igreja de Sacre Coeur, e a região de La Defense – centro financeiro de Paris. A arquitetura contemporânea, as obras de arte espalhadas e o arco de 110 metros de altura não conseguem ser ignorados, apesar do contraste que fazem com o resto da cidade. Lá estão os maiores prédios da capital francesa – 72 prédios de aço e vidro, 14 arranha-céus com mais de 150 metros de altura, mais de 150 mil trabalhadores diários. A visita vale a penas, mesmo que seja para falar mal depois.

La Defense ao fundo - para a alegria de uns e desgosto de outros

Bordéis, igrejas, artistas e personagens
No século XIX, Montmartre era considerado, pelos cidadãos mais bem comportados de Paris, um antro de depravação. Artistas, escritores e poetas eram freqüentadores dos bordéis, teatros de revista, cabarés e demais estabelecimentos que definiam a reputação do bairro. A vida noturna era bem animadinha e, por muitos anos, fomentou a inspiração de muitos artistas. Certamente, deve ter alimentado, também o imaginário dos puritanos de plantão. Melhor do que ninguém, Manet, Toulouse-Lautrec e Degas retrataram esse clima de luxúria nos seus quadros, onde é possível reviver toda a atmosfera do bairro. Nessa área, os destaques são os dois museus: Musée d’Art Naïf Max Fourny e de Montmartre; a Place du Tertre reúne retratistas; La Mère Catherine, o restaurante preferido dos cossacos russos em 1814, explica a origem da palavra “bistrô”: impacientes, os clientes russos gritavam “bistro!”, que significa “rápido” em russo. 

Mas o grande chamariz do bairro é a inconfundível basílica romano-bizantina de Sacré-Coeur, toda branca, que fica no alto da colina. Para subir, se não quiser usar as escadas, o funiculaire fica no final da Rue Foyatier. Lá de cima, a melhor vista de Paris, seus telhados, cúpulas e prédios que sobressaem no horizonte. Uma dica é visitar Sacré-Coeur no final da tarde, para aproveitar o por do sol, curtir os artistas de rua, observar a arte que se espalha pelas calçadas e jantar num dos muitos e pitorescos restaurantes da Praça Montmartre. Muitos franceses não gostam de Sacré-Coeur. Consideram-na de gosto duvidoso, dizem que as formas arredondadas não são elegantes e contrastam com outros monumentos “bem aceitos” da cidade.
A cidade vista do alto

Sacré-Coeur no alto da cidade

um dos muitos artistas de rua
a vida em Montmartre é uma festa!

Outras igrejas imperdíveis são a Sainte-Chapelle, Saint-Germain-l’Auxerrois, Saint-Jacques, Sainte-Madeleine, Saint-Denis e, a mais famosa de todas, Notre Dame, localizada na Ile de la Cité, o berço da cidade. A catedral é uma obra-prima gótica e consumiu intermináveis 170 anos de trabalho. Nela, foram coroados Napoleão e Josefina, além de outros imperadores e vários reis. Também foi cenário para o famoso Quasímodo, personagem de O Corcunda de Notre-Dame, de Victor Hugo, apaixonado pela cigana Esmeralda. Mas, também foi palco de violência, quando revolucionários a transformaram em templo do culto à razão e depósito de vinho. Graças a Napoleão, o mundo a teve de volta. Todos os domingos, às 16:30, antes da missa das 18 horas, a igreja oferece concertos de órgãos, com entrada gratuita. Durante todo o ano, também são organizados concertos de música sacra. A entrada é gratuita, mas a visita às duas torres é paga. Definitivamente, os 400 degraus. A vista que se tem é das mais bonitas e ainda dá para ver as gárgulas de pertinho.


Notre Dame

Perto dali, fica uma das 10 melhores sorveterias do mundo, a Berthillon, fundada em 1954. O carro-chefe da casa é o sorvete de morangos silvestres (fraises de bois), mas as opções são muitas. Tudo é feito artesanalmente, com ingredientes naturais, sem corantes ou conservantes, e frutas da estação selecionadas. Por isso, a carta de sabores pode variar de acordo com a época do ano. Sendo que, entre a segunda quinzena de julho a o final de agosto, os sorvetes não são fabricados, nem mesmo para os revendedores espalhados pela cidade.

E assim como é impossível ver tudo o que Paris tem a oferecer, numa só viagem, é frustrante terminar aqui sem falar do Museu de Rodin, do Centre Pompidou, das galerias de arte, dos sebos charmosos, dos jardins, do Marais, dos cemitérios, dos palácios espalhados pela cidade, do Café de la Paix e sua decoração do século XIX, da Ópera, dos românticos boulevards, da magnífica culinária... enfim, visitar, ler, escrever, sonhar com Paris é assunto para várias encarnações. Como dizia Hemingway, Paris não tem fim. E não tem, mesmo!